Anderl Heckmair
Poucos
escaladores Brasileiros ouviram falar em Anderl Heckmair, provavelmente só os
praticantes de Alta Montanha devem ter lido sobre ele.
E
quem foi então Anderl Heckmair?
De
família modesta, filho de um horticultor, nascido em Munique em 02 de outubro de
1906 e falecido aos 98 anos em 01 de fevereiro de 2005, 70 anos depois de ter
realizado aquilo que é considerado um dos maiores feitos do alpinismo entre as
duas grande guerras, a conquista da Face Norte do Eiger em 1938.
O
nome Anderl Heckmair, ficou ligado para sempre a imponente Face Norte do Eiger,
a mais temida dos Alpes. Junto aos seus três companheiros de aventura, Harrer,
Kasparek e Vörg, o guia alemão logrou o que tanto havia sonhado e buscado no
decorrer de muitos anos e tentativas: uma grande ascensão que o colocou na
história do alpinismo.
Vencer
ou morrer
Em
seu livro os Três Últimos Problemas dos Alpes (que é considerado o
Antigo Testamento do Alpinismo clássico), Heckmair recorda com nostalgia as
origens e o esplendor da escola de Munique, que mais que uma escola
propriamente dita eram pequenas agremiações de escaladores mais ou menos associados
com o Clube Alpino Alemão.
Se foram os Ingleses (com nomes míticos como: Winpher,
Murmmery, Yuong e Ryan), os suíços e os franceses (com guias lendários como
Knubel, Lochmatter e Carrel), que deram os primeiros passos nos Alpes, seriam
os alemães, austríacos e italianos que dominariam o terreno nas décadas de
vinte e trinta. Conquistados todos os grandes cumes europeus, o objetivo lógico
dessa Segunda Idade do Ouro consistiu claro, em escalar as paredes mais
difíceis, praticando um alpinismo extremo, cujo lema era “Vencer ou morrer”.
Aos elegantes cavaleiros do Clube Alpino Britânico e os ilustres guias suíços e
franceses sucederam os jovens germânicos, desfarrapados que peregrinavam em
suas estropiadas bicicletas em busca dos últimos santuários de rocha e gelo dos
Alpes.
A morte era moeda comum e corrente naquela época, o
óbolo com que os audazes alpinistas teutônicos pagavam pôr sua ousadia. Em
ocasiões, seus corpos nem sequer eram enterrados: Heckmair conta como
encontrou, disseminados aos pés da parede sul da Drusenfluh, vários cadáveres
de escaladores que haviam despencado tempos atrás, com o descaso próprio da
juventude. Heckmair chamou os cadáveres de “postes indicadores”, e empreendeu
sem vacilo a escalada, junto com Hans Brehm. Era a décima cordada a tentar a
via, e ambos romperam o feitiço que pesava sobre as cordadas de dois que
atacavam aquela parede, pois anteriormente, todas haviam desaparecido na
Drusenfluh.
Heckmair
tinha uma agenda apertada, nos fins de semana escalava, as segunda e terças descansava,
quarta ia ao enterro de algum dos escaladores mortos durante o fim de semana. A
naturalidade com que os muniquenses lidavam com a morte chegava ao ponto de ser
durante os funerais que discutiam o que iam fazer no fim de semana, as quintas
e sextas, Heckmair se dedicava a preparar o material para a próxima escalada.
Não é estranho que o ajuntamento de Munique decidira prescindir de seus
serviços.
O
jovem montanhista não parecia preocupar-se muito com seu futuro. A única coisa
que lhe inquietava era o tempo que restava a frente, já havia feito trinta anos
e todavia não havia realizado nenhuma escalada de verdadeiro renome. Em 1931 os
irmãos Toni e Franz Schmid haviam vencido a Face Norte do Cervino, e em 1935,
Peters e Maier escalaram a monumental parede Norte das Grandes Jurasses. Só
restava as paredes de primeira magnitude a Norte do Eiger e o Esporão Walker.
O
Eiger
O
Eiger é uma montanha de 3970 metros de altitude e 1168 metros de proeminência nos Alpes Berneses, na Suíça. Faz parte do conjunto
Jungfrau-Aletsch-Bietschhorn, declarado Patrimonio da Humanidade pela Unesco em
2001. É o pico mais oriental da cadeia que se estende cruzando o Mönch (4099 m)
e o Jungfrau (4158 m). O lado norte da montanha ergue-se cerca de 3 km sobre
Grindelwald e outros vales habitados do Oberland bernês, e a vertente
meridional fica frente à região de Jungfrau-Aletsch, coberta por alguns dos maiores
glaciares dos Alpes.
A
vertente norte do Eiger é considerada pela sua dificuldade em escalar como uma
das grandes vertentes norte dos Alpes.
O Eiger (Ogro para os
alemães), forma um aterrorizante paredão de rocha calcária que atrai como um
imã nuvens e tormentas. Sua localização muito próxima a um pequeno hotel
permite que os curiosos observem com seus telescópios o lento avanço dos
escaladores. Os desastres se sucederam durante décadas, mesmo depois de sua
conquista, os homens lutavam e morriam agarrados no âmbar branco, corpos
ficavam pendendo no vazio como pequenos insetos, durante anos.
Quando Heckmair decidiu tentar a sorte, o Eiger havia
devorado muitos dos melhores alpinistas da época: Mehringer e Sedlmayr em 1935,
Angerer, Reiner, Hinterstoisser e Toni Kurz's em 1936. Um ano depois, Hans
Rebitsch e o próprio Vörg se converteram nos primeiros renanos que o Eiger
deixou escapar com vida. Ante o perigo mortífero da parede, e o enorme perigo
que corriam as expedições de resgate, o governo suíço proibiu as ascensões,
mais o veto só serviu para atiçar mais a vontade dos escaladores.
![]() |
Corpo de Toni Kurz's |
Em 1938, Heckmair,que havia sobrevivido no ano anterior a
uma tentativa com Theo Lesch, se encontrava em um verdadeiro labirinto de rocha
e gelo junto com Vörg. Além deles outras duas cordadas também estavam lutando
em um neveiro, uma delas era formada por Heinrich Harrer e Fritz Kasparek. Mas
ante o primeiro sinal de mal tempo, Heckmair e Vörg decidiram retirar-se e
passar a noite em Alpinglen, onde uma multidão se reunia diante das lunetas
para observar a luta das outras duas cordadas contra o Ogro. Pela manhã, uma
das equipes se retira e Heckmair e Vörg regressam a parede com os ânimos
renovados. Quando alcançam Harrer e Kasparek, quase espontaneamente a
rivalidade entre as duas cordadas se transforma em uma aliança indestrutível, como
um centauro de quatro braços e pernas, sem duvida nenhuma a cordada de quatro alpinistas
mais celebre da historia. Com seu instinto infalível Heckmair abre caminho,
Vörg faz a segurança, Harrer e Kasparek vão atrás carregando o material mais
pesado nas mochilas e recuperando os pitons. Nas ultimas enfiadas, Heckmair cai
ao vazio varias vezes, Vörg lhe segura sem vacilar, mas em uma dessas quedas o
grampom de Hackmair atravessa a mão de Vörg, Heckmair tira de sua mochila um
estimulante cardíaco, da metade a seu companheiro e bebe a outra. E se lança de
novo as rampas de gelo finais do Eiger.
Perdido
na metade da noite, exausto depois de três dias e duas noites de escalada na
parede, golpeado pôr aludes e avalanches de pedra, Heckmair esta a ponto de
cair no outro lado da montanha, quando um grito de Vörg o detém. Conseguiram,
estão no cume. Atrás ficaram passagens que deixam arrepiados os cabelos de
gerações de alpinistas, como letanía, ninho das Golondrinas, travessia
Hinterstoisser, bivaque da morte, travessia dos deuses, aranha....
![]() |
Heinrich Harrer, Fritz Kasparek, Anderl Heckmair e Ludwig Vorg |
![]() |
Fritz Kasparek e Heinrich Harrer durante a primeira subida da Face Norte |
![]() |
Equipamento usado na conquista da Face Norte |
Depois da conquista e da condecoração de Hitler (obrigado pelos tempos que vivia a Alemanha, mas nunca aceita) o destino dos quatro alpinista correu diferentes caminhos: Vörg e Kasparek morreram (o primeiro combatendo na Polônia em 1941 e o segundo ao cair numa fenda de gelo no Salcantay - Peru); a odisseia de Harrer no Tibet (prisioneiro britânico, fuga para Lhasa e finalmente confidente pessoal do Dalai Lama), é hoje conhecida pela sua obra “Sete anos no Tibet”.
E Anderl?
Anderl seguiu escalando e fazendo montanha, e também sonhando com as montanhas, pois algumas delas, como os gigantes do Himalaya, nunca teve diante de si. Nos Alpes retomou algum daqueles grandes problemas que outros se adiantaram (Walker em condições semi-invernais, em agosto de 1951), alem disso se empregava como guia durante o pós-guerra e a escalar em diversas partes do mundo.
Além da façanha do Eiger, Anderl participou
de alguns expedições no Himalaya (1954), na África (1960), na Cordilheira
Branca dos Andes e nas montanhas Rochosas (1965).
Realizou diversas ascensões
importantes como:
·
1929
- Via Solleder do Monte Civetta, Dolomitas
·
1931
- Face norte da Aiguille des Grands Charmoz
·
1931
- Primeira ascensão da Calotte de Rochefort (Grandes Jurasses)
·
1932
- Diversas primeiras na Jbel Toubkal (Marrocos)
·
1938
- Primeira da face norte do Eiger
·
1951
- Esporão Walker na Agulha Preta de Peuterey das Grandes Jurasses em companhia
de Hermann Köllensperger
Em 1933 obteve o título de guia de
montanha. Depois da Segunda Guerra Mundial dirigiu a escola de esqui de
Oberstdorf, onde viveu até à sua morte em 2005.
Para quiser saber mais detalhes da vida desse grande montanhista veja:
https://www.amazon.com/Books-Anderl-Heckmair/s?ie=UTF8&page=1&rh=n%3A283155%2Cp_27%3AAnderl%20Heckmair
Ver Também; Os Conquistadores do inútil.
http://graal-rio.blogspot.com.br/2010/08/lenda-eigerwand-parede-do-ogro-muito.html
Comentários